20 de julho de 2016

A Transformação..


Quantas vezes por dia, vaidoso leitor, você procura seu reflexo em objetos.
Há pessoas, eu tento não me classificar nesta categoria, que passam em frente a uma vitrine de loja somente para olhar seu reflexo e verificar sua aparência. 
Mesmo que você não se enquadre neste grupo de pessoas, sua aparência  - direta ou indiretamente - é uma preocupação. 

E, se você ficasse catorze anos sem ver sua aparência em nenhum objeto. Catorze anos sem olhar sua aparência nem em um pedaço de vidro quebrado. 

Foi assim que Edmond Dantès permaneceu durante seu "temporada" na fortaleza de If. Este personagem não sabia como estava sua aparência enquanto permaneceu encarcerado {injustamente} no calabouço de If. Catorze anos.

Porém, depois da fuga insana, do desespero em se esconder e de se fazer encontrar por um grupo de marinheiros de reputação suspeita, Dantès tem a oportunidade de olhar para si mesmo {não da maneira filosófica}.

Ao entrar em uma barbearia, a transformação começa: 


(¹) Sa figure ovale s’était allongée, sa bouche rieuse avait pris ces lignes fermes et arrêtées qui indiquent la résolution ; ses sourcils s’étaient arqués sous une ride unique, pensive ; ses yeux s’étaient empreints d’une profonde tristesse, du fond de laquelle jaillissaient de temps en temps les sombres éclairs de la misanthropie et de la haine ; son teint, éloigné si longtemps de la lumière du jour et des rayons du soleil, avait pris cette couleur mate qui fait, quand leur visage est encadré dans des cheveux noirs, la beauté aristocratique des hommes du Nord ; (²) cette science profonde qu’il avait acquise avait en outre reflété sur tout son visage une auréole d’intelligente sécurité ; en outre, il avait, quoique naturellement d’une taille assez haute, acquis cette vigueur trapue d’un corps toujours concentrant ses forces en lui.
(¹)À l’élégance des formes nerveuses et grêles avait succédé la solidité des formes arrondies et musculeuses. Quant à sa voix, les prières, les sanglots et les imprécations l’avaient changée, tantôt en un timbre d’une douceur étrange, tantôt en une accentuation rude et presque rauque.
En outre, sans cesse dans un demi-jour et dans l’obscurité, ses yeux avaient acquis cette singulière faculté de distinguer les objets pendant la nuit, comme font ceux de l’hyène et du loup.
(³)Edmond sourit en se voyant : il était impossible que son meilleur ami, si toutefois il lui restait un ami, le reconnût ; il ne se reconnaissait même pas lui-même.


Esta é a chave para o reencontro de Dantès com seus inimigos {e mesmo com Mercédès}. Sua figura estava com uma mudança externa que a ausência de um disfarce não comprometeria sua vingança. O jovem e sonhador Dantès que foi encerrado em um calabouço úmido, sujo e despojado de vida transformou o homem que de lá fugiu em um desconhecido para todos aqueles que foram os agentes desta metamorfose.
Eu separei o trecho acima em três pontos que achei interessantes:

(¹) - As linhas físicas mudaram. O rosto sofreu uma mutação não somente pelas rugas que o tempo distingue no ser humano - havia tristeza, raiva e sofrimento na face de Edmond.
A voz de Dantès também mudou devido choro e soluços que ele emitiu durante sua estada no calabouço. Muitas vezes, antes da presença do abade Faria, Dantès se assustou com o som da sua própria voz. Não havia nenhum outro preso, antes do italiano, com quem o protagonista desta história pudesse conversar, pois até seu carcereiro era mudo.

(²) Ao descobrir por acaso seu amigo, o abade Faria, Dantès teve a oportunidade de aprender. E esse aprendizado também mudou sua aparência. Conforme escrito, uma "auréola de inteligência" cobria a face de Dantès - e foi esta visão que fez Jacopo {sobre quem escreverei em outro momento} doar sua afeição ao fingido náufrago de Tiboulen.

(³) E, por fim, sua aparência lhe agradou. Saberia que ninguém o poderia reconhecer: não era apenas um homem morto para seus inimigos; era a Vingança ressuscitada das profundezas do calabouço.

O injustiçado rapaz de 19 anos foi abandonado na fortaleza de If; catorze anos se passaram, e o anjo vingador surgiu...e ninguém sabia qual era sua aparência.

Omnia Vanitas.

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