5 de maio de 2020

Releitura de "As Viagens de Gulliver"..



Olá, anônimo leitor!

Estou na segunda leitura deste livro do Swift, depois de mais de oito de distância da primeira. E é um novo olhar por dois motivos.

Primeiro, faz muito tempo desde a primeira leitura, todas as particularidades foram esquecidas conforme outras leituras foram feitas depois desta. 

Segundo motivo foi que desta vez eu decidi incluir as notas explicativas na leitura.
Este exemplar é da Nova Cultural (2003) com tradução e notas de Therezinha Monteiro Deutsch. Ela, também, traduziu pela editora Best Bolso os livro Emma e Razão e Sensilidade de Jane Austen - ambos indicados pela Raquel Sallaberry Brião no seu site Jane Austen em Português como as entre as melhores traduções das obras da escritora inglesa.

Faz pouco tempo que comecei a cuidar das traduções que tenho na minha estante. Algumas edições eu tenho a oportunidade de trocar, mas em sua maioria fico à mercê do que tenho em mãos.
A primeira vez que notei uma tradução diferente foi no livro Persuasão da própria Jane Austen. Vou deixar o link aqui para não me alongar na explicação.
Para outras obras, eu uso as publicações do blog Não Gosto de Plágio da Denise Bottman.
Sendo assim, mais confiante na tradução e nota de Deutsch, eu faço desta segunda leitura de As Viagens de Gulliver uma aventura mais real da história. 

 As notas sobre o texto enriquecem muito a leitura. As observações permitem que o leitor encontre os motivos que levaram àquele trecho ou algumas possíveis ideias de estudiosos de Swift para que esta ou aquela frase estivesse ali. Estar na cabeça e na história que o escritor viveu ao escrever torna a leitura muito mais rica e completa e permite ao leitor rir da sátira que é As Viagens de Gulliver
Para não deixar você, leitor anônimo, sem um exemplo, deixarei dois para lhe dar uma luz sobre o que escrevi.

"(...) Diverti-me, entre outras coisas, como dançarinos na corda-bamba¹, que se apresentavam sobre um fino fio branco esticado a cera de um metro e meio do solo. Peço licença, e paciência ao leitor para me alonga um pouco a este respeito.
Esta diversão é praticada apenas pelas pessoas que são candidatas a altos cargos e altos favores na corte. São treinadas nesta arte desde bem pequenas e nem sempre são de nascimento nobre ou têm educação liberal. Quando um alto cargo fica vago, por morte ou queda em desgraça (o que acontece muito), cinco ou seis desses candidatos apresentam petições para divertir Sua Majestade e a corte com a dança na corda-bamba; então, aquele que saltar mais alto sem cair ganha o cargo". (página 62-3)
 (...)
"Mandei tantas cartas e petições para minha liberdade que por fim Sua Majestade mencionou o assunto no gabinete e, depois, numa reunião do Conselho, ninguém e opôs, a ser Skyresh Bolgolam², que resolveu, sem nenhum motivo, ser meu inimigo mortal". (página 67).

Notas:

(1):  dançarinos em corda-bamba: exibição preferida ente os divertimentos populares no período. Para avaliar o significado satírico, confrontar com a observação de Swift num panfleto religioso (1709): "Leve-se em conta que andar na corda-bamba é o único talento requerido por um ato do Parlamento para transformar um homem em bispo; não se duvide de que depois de ter feito esta demonstração de atividade, de estar em forma, esse homem poderia sentar-se na Câmara dos Lordes...mas é preciso ser pouco cristão para acreditar que esse funâmbulo depois disso tornara-se um tiquinho ais bispo do que antes..." prose, ii, 75; E.W. Rosenheim, PQ, xxxi, 1952, 209).

(2): Skyresh Bolgolam: "Estilo 'im Mar'boro'" (Clark, pp 604-5, i.é,; o duque de Marlborough, a quem Swift atacara várias vezes (principalmente no Examiner, 23 de novembro de 1710) como chefe representativo da polícia-de-guerra dos whigs*. Firth (p.242) identifica Bolgolam como o conde de Nottingham, que usou sua iinflência para impedir que Swift conseguisse um bispado. Se bem qu não fosse um almirante, Nottingham fora Primeiro Lode do Almirantado (1680-4), e se bem que totalmente ignorante em conhecimentos marítimos, sempre se vangloria de ser um perito naval. Case (p.72), que relata a carreira de Gulliver em Liliput não em relação à biografia de Swift, mas sim em referência à sorte política de Oxford e Bolingbroke, aceita esta identificação pelo fato de que Nottingham era hostil a Oxford "sem que tivesse havido nenhuma provocação", a ser o fato de Oxford (então Harley) tê-lo sucedido no cargo (1704).

*whigs: Whig é uma expressão de origem popular que se tornou termo corrente para designar o partido liberal no Reino, e contrapunha-se ao Tory, de linha conservadora.

Eu ainda estava procurando algumas informações sobre a tradutora quando achei dois trabalhos que serão um ótimo suporte para esta leitura, segue os links abaixo;

- Autor: Leonardo José César de Mattos Guerra. Título: Viagens de Gulliver: recepção (história) e interpretação (crítica)

- Autor: Evaldo Gondim dos Santos. Título: Tradução e ironia: o cientificismo iluminista em Gulliver’s Travels vs. (As) Viagens de Gulliver

Então é isso, leitor!

Omnia Vanitas. 💀


3 de maio de 2020

Memórias de um Médico: primeira parte..


Livro um
Livro dois
Livro três
Livro quatro


Olá, leitor anônimo!!

Que prazer ter concluído esta primeira parte da saga Memórias de um Médico! Esta coleção estava mais de cinco anos na minha estante para a primeira leitura. E, desde a compra desta coleção foi algo muito especial para mim.
Deixe-me contar:

Eu tinha o plano de fazer um projeto de leitura livre no bairro que eu morava com meus pais; apenas um plano, quando uma amiga leu e levou à frente o projeto. Ela conseguiu vários patrocínios, bateu em várias portas para conseguir tudo o precisava para montar uma caixa para abrigar os livros. Depois, fomos buscar quem nos ajudaria com livros gratuitos para encher a caixinha. Visitamos alguns lugares que poderiam fornecer alguma doação para o projeto e, entre esses lugares, estava o sebo que eu amo visitar em Joinville - O Sebo Livraria. Foi lá que encontrei, sem ter procurado por ele na ocasião: foi na conversa informal com a dona do sebo sobre adaptações cinematográficas que cheguei a comentar sobre a saga e...ela tinha ! Não coleção completa, faltavam dois volumes que seriam muito fáceis de achar na internet ! E foi minha amiga que pagou para mim 😜 ..pois eu não tinha dinheiro na hora.

Ano passado eu fiz um "stories" no Instagram*  para comemorar o nascimento de Maria Antonieta pois a saga começa com a chegada dela na França para se casar com o Delfim (futuro Luíz XVI) e, me cobrei essa leitura pois era um crime ter passado tanto tempo para começar a lê-la. E, em Dezembro/19 eu trouxe a primeira parte para casa e jurei que começaria essa coletânea.
Neste ano, em março, foi obrigatório o recolhimento social por conta do COVID-19, então decidi começar a leitura desta obra de Dumas. Um dos motivo principais era não levar esses livros para minhas viagens de transporte urbano para não danificar mais a capa e páginas. Missão cumprida.

A leitura de todos os volumes foi muito agradável. Dumas (e Maquet) souberam compor uma trama que não deixou a leitura massante. Cada personagem foi bem aprofundada. Esta leitura me lembrou muito outras duas leituras: O Conde de Monte-Cristo (pela trama construída em lugares diferentes que se unem em determinada parte da narrativa) e O Visconde de Bragelonne por todas as tramas palacianas - o que me deixou com muita vontade de reler a trilogia de Os Três Mosqueteiros. 

Os romances de Alexandre Dumas são em sua maioria históricos. As suas personagens são reais mas o autor lhes dá atitudes que ele decide que servem para a sua obra. Ele não teve a intensão de tomar a história ao pé da letra, mas se utilizou dela para compor a sua realidade.  Portanto, a maior parte de seus personagem foram emprestados da história sem intensão de serem reais.
A corte francesa de Luíz XV está toda lá: a amante Du Barry, o marechal Richelieu - sim, mais um Richelieu, as filhas, o delfim, a nora Maria Antonieta... e o homem que dá nome a saga: Giuseppe Giovanni Battista Vincenzo Pietro Antonio Matteo Balsamo. José Balsamo.

Eu desconhecia totalmente esta personagem histórica. Ele foi tudo o que o Balsamo de Dumas é: maçom, alquimista, ocultista, feiticeiro, curandeiro - deve até jogar no bicho!
É com Balsamo que a trama inicia lá no livro um. Ele é o médico cuja memória é escrita.

O verdadeiro Balsamo, Giuseppe tinha uma real Lorenza - mas dela não procurei muito, visto que ela já deixou a trama. Giuseppe foi caçado pela inquisição e, teve um mestre que lhe ensinou sobre alquimia quando o rapaz tinha apenas dezessete anos. Giuseppe também atende pela alcunha de Alessandro, conde de Cagliostro e há alguns livros publicados sobre ele e o seu julgamento durante a Revolução Francesa.
Balsamo é respeitado até hoje como ocultista. Suas últimas palavras antes de morrer foram:
“Sono un cavaliere errante. Non sono di alcuna epoca né di alcun luogo, al di fuori del tempo e dello spazio, il mio essere spirituale vive la sua eterna esistenza e, se immergendomi nel mio pensiero risalgo il corso delle età, se distendo il mio spirito verso un modo d’esistenza lontano da quello che voi percepite, divengo colui che desidero."

Tradução: "Sou um cavaleiro errante. Não sou de nenhuma época ou lugar, fora do tempo e do espaço, meu ser espiritual vive sua existência eterna e, se imergindo em meu pensamento, volto ao longo dos tempos, se forçar meu espírito a uma maneira de existência longe do que você percebe, eu me torno o que eu desejo".

Nisso Dumas e Maquet acertaram: o José Balsamo da trama fictícia é um viajante além do tempo.

Omnia Vanitas.

*Salvo na pasta "Alexandre Dumas".

2 de maio de 2020

Fábula de La Fontaine..



O Louco que vende Sabedoria

Mantenham distância dos loucos, é o melhor conselho que posso lhes dar. Há muitos na corte e os príncipes gostam deles porque disparam seus chistes contra os teimosos, os tolos e os patifes.
Um Louco ia gritando, pelas ruas e praças, que vendia sabedoria, e muitos crédulos corriam para comprá-la. Fazia estranhas caretas e, depois de tomar-lhes o dinheiro, lhes dava uma bofetada e dois metros de barbante. A maior parte dos enganados se revoltava, mas de que adiantava? Acabavam sendo zombados duplamente: o melhor era rir e ir embora sem dizer nada. Buscar naquilo algum sentido seria levar a sério os mentecaptos. Qual razão explica os atos de um louco? A causalidade é o que movo o cérebro de um transtornado. Mesmo assim, um dos enganados foi procurar um homem erudito, que, sem vacilar, lhe disse: "O barbante e a bofetada têm sim um significado: toda pessoa de bom senso deve manter-se longe dos Loucos e a distância desse cordão. Se não fizer assim, se expõe a tomar uma pancada. O Louco não enganou ninguém: ele realmente vende sabedoria".

Le Fou qui vend la sagesse

Jamais auprès des fous ne te mets à portée:
Je ne te puis donner un plus sage conseil.
Il n'est enseignement pareil
À celui-là de fuir une tête éventée.
On en voit souvent dans les cours :
Le Prince y prend plaisir ; car ils donnent toujours
Quelque trait aux fripons, aux sots, aux ridicules.
Un Fol allait criant par tous les carrefours
Qu'il vendait la sagesse ; et les mortels crédules
De courir à l'achat : chacun fut diligent.
On essuyait force grimaces ;
Puis on avait pour son argent
Avec un bon soufflet un fil long de deux brasses.
La plupart s'en fâchaient ; mais que leur servait-il ?
C'étaient les plus moqués ; le mieux était de rire,
Ou de s'en aller, sans rien dire,
Avec son soufflet et son fil.
De chercher du sens à la chose,
On se fût fait siffler ainsi qu'un ignorant.
La raison est-elle garant
De ce que fait un fou ? Le hasard est la cause
De tout ce qui se passe en un cerveau blessé.
Du fil et du soufflet pourtant embarrassé,
Un des dupes un jour alla trouver un sage,
Qui, sans hésiter davantage,
Lui dit : Ce sont ici hiéroglyphes tout purs.
Les gens bien conseillés, et qui voudront bien faire,
Entre eux et les gens fous mettront pour l'ordinaire
La longueur de ce fil ; sinon je les tiens sûrs
De quelque semblable caresse.
Vous n'êtes point trompé : ce Fou vend la sagesse.

Link para o texto em língua francesa aqui.

1 de maio de 2020

Mudança de planos..


Olá, recluso leitor !!

Essa semana eu fiz uma enquete no Instagram para saber qual deveria ser a minha próxima leitura ao fim da primeira parte de Memórias de um Médico (Alexandre Dumas). As opções eram as seguintes:

- Crônicas Saxônicas (livros 7 à 10) de Bernard Cornwell
- As Cartas da Prisão de Nelson Mandela (Saham Venter - ed.)

O livro mais votado foi a saga do Cornwell. 

Nesta mesma semana, ainda em quarenta, eu estava ouvindo algum noticiário na televisão quando um avalanche de frases absurdas saíram do aparelho televisor. 
No mesmo instante eu lembrei do livro do Lima Barreto,  Os Bruzundangas. Um pequeno resumo da obra que achei na internet:
A obra é uma sátira da vida brasileira nos primeiros anos da Primeira República, Bruzundanga é um país fictício, onde havia, tal como na Primeira República, diversos problemas sociais, econômicos e culturais, entre os quais os títulos acadêmicos possuídos pelos ricos que eram não mais que pseudo-eruditos.
 Entenderam a recordação que me levou a pensar em Os Bruzundangas?

Porém, lembrei que a obra era uma inspiração no livro de Jonathan Swift, As Viagens de Gulliver.
Como, por sorte, eu tenho o livro do Swift na minha estante (já que noventa por cento está - ainda - na casa dos meus pais), eu decidi começar a leitura de As Viagens de Gulliver antes de começar o livro do Barreto.

Então é isso.. Que comece a leitura ...

Omnia Vanitas 💀

Leitura quinze..


Fim da primeira parte de Memórias de um Médico, de Alexandre Dumas. 

O último livro de José Bálsamo é quase uma história a parte da trama geral. Nesta parte do enredo, o destaque é para o drama da família de Tarveney, mais especificamente os dois irmãos Andréa e Phillipe. 

O sofrimento destas personagens se deve ao antigo conhecido da casa da Taverney, Gilberto. A obsessão deste por Andréa é notado desde o primeiro livro, quando ele deixa a casa do barão para seguir Andréa até a corte francesa. Sem muito o que deixar para trás, parte com algum dinheiro nos bolsos atrás da carruagem da filha do barão. Ele foi a pé.

Gilberto é dotado de uma sorte que desgraçados como ele não deveriam ter. Quase morrendo de fome e cansaço, é acudido pela irmã da favorita do rei o meio do caminho. Depois, sem ter onde ficar em Paris, encontra Jean Jacques Rousseau - de que é grande leitor - e permanece na casa dele para ganhar dinheiro, ensino e continuar sua aproximação de Andréa. Por mais um fortuna do destino, esta mora a cem passos da casa do seu protetor e ele consegue vigiá-la ela janela do seu quarto. 
Depois, expulso da casa de Rousseau, consegue emprego de jardineiro no Trianon - onde está Andréa e, claro, a vigia mais de perto.

Gilberto é o que se chama hoje de em dia "perseguidor". E, como cultura da época, depois de estuprar sua vítima/amada, ele quer redimir seu crime casando com a moça. E, claro, arruma quem lhe dê dinheiro para o dote de casamento. 

Gilberto nunca foi uma personagem com quem consegui estabelecer uma ideia boa sobre ela. Algo na descrição dele e nas suas atitudes é incômoda: e se mostrou exatamente do que dele se esperava. Tudo o que Gilberto faz é mau - e ele tenta colocar uma "intensão" nobre para justificar suas atitudes: o desprezo de Andréa ao saber que ele é  pai do filho que ela espera (ele a estuprou enquanto ela estava entorpecida) parecia para o criminoso uma ação incoerente visto que ele a amava e queria redimir seu erro. Ele só produz um absurdo atrás do outro. Todas as oportunidades honestas que lhe apareceram na vida ele as transformou em desgraça. 

O epílogo da trama apresenta a doença do rei Luiz XV e sua morte para a ascensão do Delfim e Maria Antonieta. 

A segunda parte da saga será O Colar da Rainha, com dois volumes, e tratará do caso do colar de diamantes de  Maria Antonieta às portas da Revolução Francesa.

Omnia Vanitas 💀

O caso do cachorro ..

 Olá, esquecido leitor !   Apesar de passar muito tempo longe deste blog, tentei voltar algumas vezes mas o tempo nem sempre está do meu lad...