15 de novembro de 2012

O Melhor Prólogo..



Minha leitura das obras de Miguel de Cervantes, infelizmente, resumem-se a Dom Quixote de La Mancha e, minha atual leitura, Novelas Exemplares.

Porém, não quero deixar de comentar o quanto é hilário ler os prólogos de Cervantes. Sempre divertidos e irônicos. E, a ironia deste autor é maravilhosa - o que me lembra também da irônica Jane Austen, pois usa palavras lisonjeiras para escarnecer o objeto ironizado.

Portanto, deixo o prólogo que está em Novelas Exemplares, para deleite de quem estiver disposto a ler:

PRÓLOGO

Quisera, se fosse possível, leitor amigo, deixar de escrever este prólogo, porque não me saí tão bem no que fiz para o meu Dom Quixote a ponto de querer um segundo prólogo.A culpa disto cabe a um dos muitos amigos que, no decorrer de minha vida, pude granjear, mais por minha condição do que por mérito próprio,amigo que bem poderia, como é de costume, cinzelar-me e esculpir-me, na primeira folha deste livro, pois o famoso Dom Juan de Jáuregui dera-lhe meu retrato: com isto, ficariam satisfeitos a minha ambição e o desejo dos que quisessem conhecer o rosto e o porte de quem se atreve a comparecer, com tantas intenções, em praça pública, aos olhos de tanta gente, e colocar-se-ia debaixo do retrato: “Este, que aqui vedes, de rosto aquilino, de cabelo castanho,de testa lisa e alta, de olhos alegres e nariz adunco, ainda que bem proporcionado, de barbas de prata que, há mais de vinte anos foram de ouro, de bigodes grandes, boca pequena, dentes nem de mais nem de menos, porque são apenas seis e, ainda assim, em má condição, muito mal dispostos, pois não têm correspondência uns com os outros; o corpo, entre dois extremos, nem grande,nem pequeno; de cor viva, mais branca do que morena, de espáduas um tanto largas e de pés não muito ligeiros; este, digo, é o retrato do autor de A Galatéia e de Dom Quixote de la Mancha e daquele que fez Viagem do Parnaso, à semelhança de César Caporal Perusino e outras obras que andaram perdidas por aí, talvez até sem o nome de seu dono, que se chama Miguel de Cervantes Saavedra. Foi soldado durante muitos anos, escravo por cinco anos e meio e foi aí que aprendeu a ter paciência na adversidade. Perdeu, na batalha naval de Lepanto, a mão esquerda com um tiro de arcabuz, defeito que, embora pareça feio, ele o considera formoso por tê-lo conseguido na mais memorável e difícil das ocasiões que os séculos passados jamais viram, nem hão de ver os séculos vindouros, lutando sob a bandeira vencedora de Carlos V, filho do raio da guerra, de quem se lembra com muita saudade. E se este amigo, do qual me queixo, não se lembrasse de dizer, a meu respeito, outras coisas além das já mencionadas, eu acrescentaria a mim próprio duas dezenas de depoimentos e os daria em segredo a fim de que engrandecesse meu nome e tornasse meu talento digno de crédito, pois pensar que os tais elogios dizem somente a verdade é disparate, e isso porque nem os elogios nem os vitupérios têm fundamento, tampouco são verdadeiros.
Enfim, já que o tempo se foi e eu passei em branca nuvem, serei obrigado a valer-me de minha lábia, que, embora gaguejante de natureza, não o será para falar certas verdades que, embora ditas por metáforas, possam ser entendidas claramente.E assim, digo-te outra vez, leitor amigo, que de maneira alguma poderás fazer confusão com as novelas que te ofereço, porque elas não têm nem pé, nem cabeça, nem miolo ou coisa parecida; quero dizer que os galanteios amorosos,que em algumas encontrarás, são honestos e tão orientados pela razão e pelos preceitos cristãos, que não podem levar a um mau pensamento tanto o descuidado como o cuidadoso que os ler.Dei-lhes o nome de Exemplares e, se observares bem, não verás nenhuma da qual não se possa tirar algum exemplo proveitoso e, se não fosse prolongar demasiadamente este assunto, talvez eu te mostrasse o saboroso e honesto fruto que se pode obter tanto de todas juntas como de cada uma em separado.Minha intenção foi colocar, em praça pública, uma mesa de trucos, onde cada um possa divertir-se sem prejuízo das barras (No jogo de truque ou truco é um aro de ferro fixo na mesa. N.T) isto é, sem prejuízo da alma ou do corpo,porque os exercícios honestos e agradáveis oferecem mais benefícios do que males.Sim, porque não é só estar nos templos, ou só ocupar as tribunas, ou só escravizar-se aos negócios, por mais necessários que sejam; há também horas de descanso para que o irrequieto espírito possa repousar.Para isto, fazem-se as alamêdas, procuram-se as fontes, aterram-se as encostas e cultivam-se, de maneira curiosa, os jardins.Uma coisa, porém, eu me atreverei a dizer-te: se, de algum modo, fizesse eu com que a leitura destas novelas induzisse quem as lesse a algum mau desejo ou pensamento, preferiria cortar a mão que as escreveu a publicá-las.Minha idade não está para brincar com a outra vida.Para isto esforçou-se o meu engenho, leva-me por aqui a minha vocação;eu me considero - e assim o é - o primeiro a novelar em língua castelhana, poisas inúmeras novelas que nela andam impressas são todas traduzidas de língua estrangeira e estas aqui são minhas mesmo, não são imitadas, nem roubadas;concebeu-as o meu talento, pariu-as a minha pena e vão crescendo nos braços da imprensa. Depois delas, se a vida me permitir, eu te oferecerei os Trabalhos de Persiles, livro que se atreverá a competir com Heliodoro, se o tiro não lhe sair pela culatra; primeiro verás, e rapidamente, dilatadas as fachadas de Dom Quixote e a galhardia de Sancho Pança; logo a seguir, as Semanas do Jardim.Estou prometendo muito para fôrças tão insignificantes como as minhas, masquem haverá de frear os desejos? Quero que consideres apenas isto: se eu tive a ousadia de oferecer estas novelas ao grande Conde de Lemos, há algum mistério secreto que as edifica. Apenas isto; de resto, que Deus te guarde e quedê a mim paciência para considerar um bem o mal que há de falar de mim uma meia dúzia de melindrosos e almofadinhas. Adeus.

12 de novembro de 2012

Ex-morador de rua dirige bicicloteca no centro de São Paulo





Este é o título da reportagem que encontrei em um site. Esses dias, mexendo no Facebook, compartilhei a foto acima, sem saber de quem se tratava, e escrevi: um dia vendo tudo e vou semear o mundo.

Agora, essa foto se tornou mais real quando li a história da vida deste semear de livros.

Lê-se:

Foi em uma vitrine que Robson César Correia de Mendonça se deparou com a maior dor de sua vida. Vagando pelas ruas de São Paulo, deteve-se por um momento em frente a uma loja para assistir na TV ao noticiário que falava de um acidente, na estrada para Juazeiro do Norte (CE). Uma família gaúcha dizimada. A sua.

Dois anos antes, ele deixara em sua cidade natal, Alegrete (RS), onde era pecuarista, para tentar construir uma história na metrópole paulista. A mulher e os dois filhos -um casal- viriam depois, quando já estivesse devidamente instalado. Carregara consigo uma quantia que hoje equivaleria a cerca de R$ 200 mil, provenientes da venda de uma propriedade e alguns animais, e o propósito de estabelecer um negócio próprio -"comprar um prediozinho, montar um restaurante, começar uma vida nova".

Logo que desembarcou no Terminal Rodoviário do Tietê, há 12 anos, Robson, então com 50 anos de idade, diz ter sido vítima de um sequestro. "Da rodoviária, vendo todo o dinheiro que eu tinha, eles me levaram até o vale do Anhangabaú, onde fizeram um documento falso de aposentado por invalidez, usado para sacar mais no banco."

Destituído de qualquer pertence, passou a perambular pelo centro da cidade e a dormir na praça da Sé. Desorientado, não conseguiu mais contato com a família. "Tentei entrar na Câmara [Municipal de São Paulo] para dar um telefonema, mas fui proibido por ser morador de rua."

Foi levado para um albergue em Santo Amaro, na zona sul, do qual retornou para a região da praça da República para vender picolés e procurar a quadrilha que o havia sequestrado. Ele a descobriu, mas "ficou no dito pelo não dito, eles não foram presos nem nada".

Ao tomar conhecimento do acidente, que interrompeu o sonho de sua mulher de conhecer a cidade de Juazeiro do Norte, no Ceará, entrou em depressão. Para fugir da "loucura total" e da droga e em busca de alguma dignidade para os moradores de rua, que via serem tratados "como bichos", conta que se apegou à leitura.

REVOLUÇÃO DOS BICHOS

Marcou-o especialmente o livro "A Revolução dos Bichos", de George Orwell, que encontrou em uma minibiblioteca de um albergue no Brás. O título da obra chamou a sua atenção. "Comecei a pensar que, se os animais são capazes de mudar suas vidas, por que nós, que somos animais racionais, não podemos mudar?".

Em 2000, criou, com alguns companheiros, o Movimento de Pessoas em Situação de Rua, para defender os interesses dessa população. "Brigar" na Assembleia Legislativa e no Ministério Público fazia parte de suas atribuições. Nessa época, sustentava-se com a venda de materiais reciclados. "Quando comecei a viver totalmente do movimento, só tomava café de manhã e comia à noite, mas nem sempre", lembra.

A comunhão com as letras se dava principalmente na biblioteca Mário de Andrade, na região central. Assíduo frequentador da instituição e sabido por seu caráter engajado -a essa altura, já tomava parte de ações de inclusão social da Agenda 21-, foi convidado para plantar uma árvore nos jardins do lugar.

BIBLIOTECA ITINERANTE

Nesse dia, sua trajetória se cruzou com a do empreendedor Lincoln Paiva, dono de uma consultoria voltada para projetos de mobilidade urbana, a Green Mobility. Paiva enxergou no desejo de Robson de "contaminar" outros moradores de rua com a literatura a possibilidade de desenvolver uma ação social.

Robson comentou com Paiva que, se pudesse, levaria livros pelas ruas para que as pessoas com acesso restrito a eles também pudessem descobrir novas motivações através das páginas - e sem sofrer preconceito. "Na biblioteca Mário de Andrade, as pessoas mudavam de mesa quando eu me sentava", recorda.

Se pudesse, disse a Paiva, carregaria os volumes em um carrinho de mão e os distribuiria para os habitantes das ruas. Paiva, um voraz fabricante de ideias -não é à toa que, por muitos anos, foi um conceituado profissional do mercado publicitário-, concluiu que a mensagem estava ali, mas o meio -de transporte, no caso- poderia ser aprimorado. Nasceu então o projeto da bicicloteca.

A partir do conceito de biblioteca itinerante, foi desenhado e construído um triciclo com um baú acoplado, com capacidade para 300 volumes. O objetivo era emprestá-los a qualquer pessoa -e não só a quem vivesse nas ruas- que se interessasse em lê-los, sem burocracia e sem que precisassem ser devolvidos. Robson seria o condutor do veículo e do projeto.

Depois de circular por três meses, a primeira bicicloteca foi roubada por um viciado em crack. Robson vivia assim outra grande dor, mas, dessa vez, havia muito o que fazer. Ele passou uma noite em claro na busca de pistas que o levassem ao paradeiro do triciclo. A investigação foi parar nas redes sociais; um vídeo da saga, produzido por Paiva, foi visto por mais de 100 mil pessoas na internet. A mídia se interessou pelo tema, que foi assunto até na BBC e no jornal francês Le Monde.

A bicicloteca foi recuperada. O projeto atraiu empresas que financiaram um modelo elétrico, com acesso à internet e placa solar. No último ano, foram emprestados 107 mil livros, 60% deles para pessoas em situação de rua, 20% para estudantes e 20% para a população em geral.

Em um final de semana de cada mês, Robson e Lincoln organizam, com a bicicloteca, um passeio gratuito por pontos do centro de São Paulo que representam episódios significativos da história literária brasileira. Integram o itinerário, por exemplo, o local em que nasceu Álvares de Azevedo, a biblioteca onde Euclides da Cunha fez a primeira leitura de "Os Sertões" e um prédio em que morou Monteiro Lobato.

Há quatro anos Robson mora em uma pensão. Luta por sua causa e contra um câncer que levou boa parte de um de seus pulmões. Seu trabalho de disseminar a cultura é patrocinado por um escritório de advocacia. E, não por acaso, diz que hoje é chamado pela polícia de "advogado dos mendigos".

"Eu procurei estudar e aprendi muitas leis, a lei do morador de rua, seus direitos constitucionais. Isso me ajudou a entender o ser humano que está na rua, tanto que, quando prendi o cara que me roubou a primeira bicicloteca, disse ao delegado que não o mandasse para um presídio, mas que o internasse para tratamento contra o vício em droga."

Em defesa da ideia de que morador de rua não é bicho, Robson fez sua própria revolução -uma espécie de vitrine para que outras vidas enxerguem novas chances de dizimar suas dores.

Fonte: Uol

Correspondências e confidências ...


Da última vez, a postagem foi uma carta de Raimundo à ingrata Ana Rosa! Se a sua pergunta é se terminei de ler "O Mulato"; sim, terminei! No momento, estou lendo "O Quarto Vermelho" de Alexandre Dumas, um mulato. Ainda pretendo escrever mais coisas sobre o livro de Aluísio de Azevedo mas, agora, quero deixar mais uma carta. Fiquei empolgada com essa "coisa" de publicar cartas. Pretendo, desde dia em diante, publicar todas as cartas interessantes que permearem meus livros.

Em "O Quarto Vermelho", um delicioso suspense à la Dumas, a sofrida Albina d'Eppstein, esposa do tirano Maximiliano, escreve a carta que transcreverei abaixo, à sua amiga Guilhermina Gaspar. Esta carta sugere um testamento, visto a crueldade que sofre a jovem condessa.

Lê-se:

"Não me é somente proibido ver-te, minha boa Wilhelmina, mas, também, escrever-te.
Por isso, esta carta só te será entregue, se eu morrer. Penso que a morte me desobrigará de tal obediência.
Não te admires destas triste apreensões, Wilhelmina: é preciso prever tudo, no estado em que me encontro. No entanto, não quereria deixar a vida, sem te-te feito, a ti, que sempre me foste tão dedicada, as dádiva do meu coração. São coisas a que se prendem todos os agonizantes, que amaram.
Meu Deus! Não sei por que as palavra saem tão tristes da minha pena, uma vez que me sinto tão alegre e tranquila. Neste momento, sorrio ao lembrar-me dos projetos que fazíamos, há dois meses. Lembras-te? Em todo caso, vou repeti-los, pois, de parte a parte, esses projetos eram quase compromissos.
Wilhelmina, prometeste-me amamentar meu filho, se eu lhe faltasse. Não te esqueças dessa promessa, pois confio nela, compreendes? Viverei, sim, espero viver para lembrar-te eu mesma. Mas ficarei mais sossegada, recordando-o aqui, no momento em que tomo uma resolução solene.
Não é tudo, Wilhelmina. Escuta: se Deus me chamasse, estou certa de que o conde Maximiliano educaria o meu filho nobremente e com todo o cuidado, mas a educação da alma, compreendes, a que se recebe nos joelhos da mãe, só uma mulher a pode dar. Os homens ensinam bem a vida, mas só as mulheres sabem ensinar o Céu... Tu, que me conheces, falar-lhe-ás de mim, muito melhor do que o pai poderia fazê-lo, que nunca me compreendeu. Fala-lhe de mim, Wilhelmina, com frequência, sempre; faz que ele me conheça com se me tivesse visto. E, depois, minha boa Wilhelmina, não lhe recuses as carícias que são tão necessárias às criancinhas, quanto o leite que as alimenta.
Pobre órfão! Que ele cresã na tua ternura e no teu amor! Sê para ele não só uma ama, mas também a mãe.
Será bem tudo isto o que quereria dizer-te? Sim, mas se por acaso esquecer alguma coisa, o teu coração adivinhará o resto dos meus pensamentos.
Mas, sem dúvida, tu deves achar-me bastante egoísta. Ainda não escrevi uma palavra a teu respeito! Aliás, ao recomendar-te o meu filho, vais ver que não me esqueci do teu. Neste envelope, encontrarás duas cartas, uma dirigida à superiora do convento de Tília Sagrada, outra ao major Kniebis, em Viena.
Se te nascer uma filha, enviá-la-ás, quando tiver cinco ou seis anos, com a primeira destas cartas, à minha boa tia, a abadessa Dorotéia, que foi para mim uma segunda mãe. A meu pedido, Wilhelmina, ela receberá imediatamente a tua filha no convento, onde fui educada juntamente com as primeiras herdeiras da Alemanha. Tempos felizes em que eu cantava tão alegremente os cânticos do Senhor. Aí, tua filha receberá uma boa e santa educação.
Se tiveres um filho, envia-o ao major, que o fará entrar para um colégio ou o colocará numa escola militar. Esse caro major era íntimo amigo de meu pai e não passava um dia sem vir a Winkel. Quem diria, ao ver-me hoje, querida Wilhelmina, que fui a mais estouvada das meninas? O major, certamente, não terá esquecido a sua queria Albina e acolherá o teu filho como se fosse o meu.
Faze pelo meu o que farei pelo teu, se viver.
Adeus, Wilhelmina. Seja como for, tenho uma convicção: as almas não morrem e a minha não deixará aquela, que não há de abandonar meu filho.
Nesta carta, que só chegará às tuas mãos, se eu abandonar este mundo, coloco, para o meu filhinho, uma pequena mecha de meus cabelos.
Adeus, ainda mais uma vez, adeus! Não te esqueças de nada! Não te esqueças!
(a) Albina d'Eppstein, nascida Schwalbachh.

P.S. Ia-me esquecendo, Ainda uma infantilidade: se eu tiver um filho, desejo que se chama Everado, como o meu pai; se tiver uma filha, desejo que se chame Ida, como a minha mãe".

DUMAS, Alexandre. O quarto vermelho. Círculo do Livro, 1960, p.58-60.

Abaixo, deixo outras cartas publicadas:

9 de novembro de 2012

Escrevo-te estas mal traçadas linhas..



Estou lendo O Mulato, de Aluísio (de) Azevedo. Que magnífica literatura!
Estou aprendendo a ler os clássicos da literatura brasileira, e, estou surpresa de gostar mais e mais de tal leitura. José de Alencar, Aluísio (de) Azevedo, Machado de Assis, Rachel de Queirós... quanta fascinação encontrei nos volumes que li! E, nesta obra atual, declaro minha admiração por Azevedo! Que livro! Que história! Todo tempo tenho vontade de postar isto ou aquilo; tenho vontade de escrever coisas sobre o que leio; porém, não me arrisco pois sei tão pouco sobre o assunto.

Entre tantas trechos fascinantes que encontrei, deixo a carta que Raimundo entregou à Ana Rosa. Cartas de amor - que não sejam as do primo Basílio (Eça de Queirós) - são deliciosas de ler. Quando li a carta de Raimundo, lembrei de outra, escrita pelo maravilhoso Capitão Wentworth à Anne Elliot, em Persuasão, Jane Austen.

Sem mais delongas, deixo a transcrição da carta de Raimundo:


“Minha amiga,

Por mais estranho que te pareça, juro que te amo ainda, loucamente mais do que nunca, mais do que eu próprio imaginava se pudesse amar; falo-te assim agora, com tamanha franqueza, porque esta declaração já em nada poderá prejudicar-te, visto que estarei bem longe de ti quando a leres. Para que não te arrependas de me haver escolhido por esposo e não me crimines a mim por me ter portado silencioso e covarde, defronte da recusa de teu pai, sabe minha querida amiga, que o pior momento da minha pobre vida foi aquele em que vi fugir te para sempre. Mas que fazer? - eu nasci escravo e sou filho de uma negra. Empenhei a teu pai minha palavra em como nunca procuraria casar contigo; bem pouco porém me importava o compromisso. Que não teria eu sacrificado pelo teu amor? Ah! mas é que essa mesma dedicação seria a tua desgraça e transformaria o meu ídolo em minha vítima; a sociedade apontar-te-ia como a mulher de um mulato e nossos descendentes teriam casta e seriam tão desgraçados quanto eu! Entendi, pois que, fugindo, te daria a maior prova do meu amor. E vou, e parto, sem te levar comigo, minha esposa adorada, entremecida companheira dos meus sonhos de ventura! Se pudesse avaliar quanto sofro neste momento e quanto me custa a ser forte e respeitar o meu dever; se soubesses quando me pesa a ideia de deixar-te, sem esperança de tornar a teu lado, tu me abençoarias, meu amor!
E adeus. Que o destino me arraste para onde se quiser, serás sempre o imaculado arcanjo a quem votarei meus dias; serás minha inspiração, a luz da minha estrada; eu serei bom porque existes.

Adeus, Ana Rosa.

Teu escravo
RAIMUNDO. “

O caso do cachorro ..

 Olá, esquecido leitor !   Apesar de passar muito tempo longe deste blog, tentei voltar algumas vezes mas o tempo nem sempre está do meu lad...