Terminei de ler "Carrie, A Estranha".
O livro é muito bom. "Carrie, AE" é um daqueles livros que você assisti ao filme e, depois, não quer dar muito crédito ao livro por achar que poderá ser frustante ler a repetição do filme sem nenhum acréscimo de "emoção". Eu fiz isso com "Carrie, AE".
À mim, o livro emocionou com a declaração do autor sobre como foi inspirada história: em seus dois fantasmas, Tina White e Sandra Irving. Confesso, fiquei com um nó na garganta ao ler este relato.
Assim como Stephen King, também tenho minhas confissões a fazer.
"Carrie, AE" é um relato do típico tratamento americano sobre adolescentes maltratando adolescentes. O tratamento de Carrie é um caso gritante de bullying. Acho que não preciso esclarecer o que é "bullying", visto os grandes absurdos que servem de exemplo para esse tipo de tratamento ao próximo.
Bom, eu já oprimi algumas pessoas. Bom, talvez não publicamente, mas, o fato de me divertir (sem participar), para mim, dá no mesmo. Lembro da frase de Martin Luther King que diz: "O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons".
Um ditado pode ser acrescentado: quem cala, consente.
Quando eu estava na sexta série, eu tive uma professora de Artes muito estranha. Ela se vestia estranha, falava estranho, andava estranho e era feia. Acho que eu tinha uns 13 ou 14 anos. Eu era estranha. Cabelo horrível, espinhas no rosto etc. Mas aquela professora era mais estranha do que eu. As garotas mais descoladas (filha de diretora, professora e agregados em geral) zoavam a professora à torto e à direito com perguntas que a inibiam, risadinhas escondidas e comentários maldosos. Eu sei, éramos adolescentes e cabeças ocas, em geral. Mas havia aquela turma que respeitava o outro. Eu era da turma dos que riem da piadinha sem graça e, depois, sentem "pena".
Ela não foi minha única professora estranha.
No ensino médio eu tive dois professores que chamaram a atenção da sala - não do modo positivo.
O primeiro foi meu professor de História. Ele era vesgo. Então, para zoar com ele, todas as vezes que ele olhava para um dos alunos, o que estava ao lado perguntava: O professor está falando comigo? - A risada era inevitável.
O outro professor era um senhor baixo, gordinho. Ele ia com uma bicicleta velha para a escola. A zoada com ele era por causa do "tic" nervoso que ele tinha (ou ainda tem). Para cada cochicho em sala, ele soltava um "shii" para o "barulhento". Um dia, para divertir a sala, eu e minhas amigas contamos quantas vezes ele fez "shii" em sala de aula.
Ao contrário de Carrie, os meus alvos não eram meus semelhantes - eram pessoas com grau superior à mim. Porém, ainda sinto um sentimento "estranho", talvez consciência pesada, por haver menosprezado essas três pessoas, em especial. Realmente, triste.
Bom, voltando ao livro.
Carrie foi alvo de bullying desde a primeira série: gorda, religiosa e pobre - só para começar. E, para piorar, mãe estranha, adolescência com espinhas, timidez estrema e gorda - mas nem tanto.
Carrie não reagia. Ela deveria ser mesmo engraçada, pois as pessoas viviam rindo dela, ela pensava.
Um dos piores dias de Carrie, foi quando ela menstruou pela primeira vez. Ela achou que estava morrendo e, suas colegas de classe, quase a mataram de vergonha.
Foi nesse dia que ela descobriu que era telecinética. Bom, não quero falar desse fenômeno paranormal da protagonista - apesar de ele ser o grande barato do livro.
Além de Carrie, outra pessoa teve uma descoberta: Susan (Sue) Snell. Gostei dela no filme e também no livro. Achei legal a atitude dela com Carrie. Cheguei a achar nobre o que ela fez. Porém, quando fechei o livro, hoje, pensei: "Ela empurrou Carrie para o precipício".
Sue pediu ao seu namorado Tommy Ross para levar Carrie ao fatídico Baile de Primavera. Tommy foi ao baile e lá mesmo morreu. Eu senti um aperto no coração quando soube da morte dele. Eu gostei dele, um cara legal, bonito, não era esnobe, inteligente e tals. Um genro perfeito para meus pais.
Susan tentou aliviar a consciência por haver oprimido Carrie no episódio da menstruação presenteando a telecinética com a companhia do bonitão e popular da escola no Baile da Primavera.
O que eu penso disso: se quer fazer algo por alguém, faça você mesma e não mande alguém no seu lugar.
Se Sue queria amenizar sua consciência ou humanizar-se em relação à Carrie, que ela mesma tomasse a dianteira e fosse ao encontro da oprimida - não se esconda atrás de ninguém.
Acho que isso tem a ver com pedir confessar o erro: admitir que estava errada. É ter que encarar o outro e falar algumas palavras pesadas, como: "Eu errei com você".
Talvez, andar com pessoas como Carrie é o mesmo que compartilhar a placa "Chute-me" nas costas. Ninguém quer andar com perdedores. Ninguém gosta de ser alvo de chacotas. Sentimos pena dessas pessoas, mas não andamos ao lado delas. Pouca vezes tomamos suas dores ou ajudamo-as à enfrentar seus medos e monstros.
Quem sabe, se Sue tivesse chamado Carrie para ir à sua casa, ou ter ido tomar uma cerveja verde no Kelly Fruit Company - ter feito ela participar da vida social comum - teria feito da protagonista alguém menos trágica, mesmo a telecinética ser muito legal (rs).
As pessoas tem medo daqueles que possuem "dons" especiais como os de Carrie - e, por isso isolam e menosprezam, algumas vezes. Que possamos ter menos Carries, Tinas e Sandras. Que sejamos mais ousados em acolher do que oprimir, visto que o último parece ser mais cômodo.
Omnia Vanitas.